quinta-feira, 11 de março de 2010

A dor que nunca te saberei contar porque não se pode dizer

quando era pequenina, talvez no 1,20m, coleccionava autocolantes. Pensava em colá-los nos cadernos para ficarem mais giros, nos livros da escola para lhes dar o meu toque, na secretária para ficar mais "fashion"... coleccionei-os sim, mas nunca os colei em lado nenhum porque não os queria gastar, não me queria precipitar na escolha do lugar para os pôr, achava sempre que teria uma ideia melhor, um lugar mais especial para os colocar... e esse lugar nunca chegou, passou só o tempo de os usar e hoje já não têm a importância que tinham, os cadernos, a secretária e os livros nunca ficaram tão giros quanto poderiam... No entanto ainda os tenho, os autocolantes! - porque a secretária, os livros e os cadernos já não existem. Depois pensei que um dia os daria aos meus filhos - lembro-me que queria seis, não fazia a coisa por menos...nessa altura já devia ter 1,43m, pela altura em que fiz o meu 1º bilhete de identidade!
Talvez eles já nao lhe dêem valor, talvez eu nem sequer tenha filhos, talvez não consiga ter filhos, talvez não haja sequer pai para eu me perder no desespero de não saber se lhe poderei dar um filho.
Talvez.
Talvez devesse ter arriscado e usado os autocolantes "naquele" momento...talvez. A verdade é que passou também a altura de coleccionar autocolantes e outras coisas palpáveis...
E ao fim de algum tempo apercebi-me que havia colecções bem mais interessantes, com prazos de validade, intransmissíveis embora "partilháveis".
Lembro-me de querer e de concretizar e lembro-me da confusão que me fazia ouvir "quem me dera ter jeito" "quem me dera ter tido oportunidade, quem me dera ter aprendido..." bla bla bla...
Lembro-me do dia em toquei viola pela primeira vez
lembro-me de ir emoldurar a minha primeira pintura a óleo
lembro-me de fazer a capa para o 1º livro que escrevi
lembro-me da 1ª medalha que ganhei no atletismo
lembro-me de sonhar e de acontecer
lembro-me de como coleccionar sonhos era divertido. Não tinha nada de espectacular, nada de magnífico. Era natural, uma espécie de jogo, de ocupação, de desafio.
Era engraçada a sensação de poder chegar onde quisesse e fazia-me comichão a forma como toda a gente se acomodava à vida que não gostavam e deixavam os sonhos lá no sítio deles (que nunca soube onde era, porque os meus vivem na palma da minha mão.
Lembro-me de tudo ser acompanhado de um desejo ardente de me distrair. Enquanto seguia os sonhos, o outro lado adormecia e eu vivia um bocadinho... O que ninguém podia ver continuava a não existir, e eu era só o outro lado... este era mentira porque era só a minha verdade.
Tinha vergonha do que não era e saudades do que nunca fora.
Os pesadelos começaram a ser verdade antes de eu os desejar e talvez por isso tenha deixado te ter sonhos e de os perseguir.
Cheguei a chamar sonho ao que se tornou o maior pesadelo.
Quando lhe chamei pesadelo apercebi-me das camadas amendrontadas de mim que estavam por trás dele.
Tudo o que escondera escancarara-se perante a minha ilusão de que o que o os outros não viam, não existia... esqueci-me do resto... não existe para eles, os outros... mas para mim, sim.
Hoje quero querer sonhar e quero não querer o que me grita na cabeça, no coração e na mão dos sonhos.
Toda a destreza da cabeça se esvai no necessário.
Tentei e reinventei formas de me dar outra e outra hipótese de me julgar digna de poder tentar outra vez, hoje sabe-me a despedida sem medo cada abraço e cada sorriso...
Não tenho medo do que já fora um pesadelo
Talvez esse seja hoje o meu maior sonho.
Talvez seja em forma de estrela o meu agradecimento a Deus,
E o meu sonho é que o perdão me chegue em forma de abraço...
Não sei ser mais

2 comentários:

esqueci a ana (ex-ana) disse...

Sonhos e pesadelos construídos ou impostos. Em princípio a 'nossa colecção de exitos' pode ser usada quando nos confrontamos com os fracassos. Certo? Errado?
A mim os sonhos dão-me força quando os pesadelos se querem instalar.
Acho que muitas e muitas pessoas (eu sou uma delas) têm casos semelhantes ao que relatas sobre os autocolantes e ...noutro plano. No âmbito académico é um fenómeno muito frequente e estudado.O rótulo (autocolante?) é procrastinação, a Carrie escreveu um post curioso sobre a propósito: http://ed-bites.blogspot.com/2010/01/seize-day-maybe-tomorrow.html

disse...

Procastinação!
Que prisão, necessidade...
Aprendi-me de outra maneira, revelo-me ao mundo todos os dias na busca desenfreada do toque dos sonhos (e das estrelas)...
Mas tantas vezes o procrastinar foi (é) O verbo!
Igual a tanta gente... crescer e conhecer o mundo e as gentes tem sido para mim o que me embrenha no lado mais saudavel.
Sabe bem quando há sabor, qualquer que ele seja!