sábado, 28 de junho de 2008

sexta-feira, 27 de junho de 2008

A palavra

Apetece-me que o fim do dia seja só o cansaço e as sensações no corpo dos passos.
Apetece-me não me apetecer mais nada depois.
Apetece-me que o tempo não me pressione nem eu a ele...Não quero o resto igual a ontem e a antes e a quase sempre desde o dia em que me recusei pela primeira vez. Digo que não quero e obedeço à ausência com o empenho da aluna dotada para corrigir as inequações mais dificeis.
A matemática aqui está errada...1 e 1 são sempre mais que 2...Porque sobra, e o restante aprisiona-se ao bloco de ser que te diz "estás viva"...A metafísica substitui-se à matemática, peço para adormecer, mas as palavras e os significados têm uma correspondência diferente...o querer dormir, a vontade de dormir, revolve-se e devolve-me um esejo secreto, cru e ácido...Aceito a vontade e recuso-me a dar-lhe esse título...Não, disso não...Nunca.
Apetece-me apetecer outra coisa...qualquer coisa que seja a palavra e o significado deste lugar de hoje, juntos. Deixa-me querer. Deixa-me Crer.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Peça

Pé e chão pegados, amordaçados um ao outro. Não largo, obedeço ou rebelo-me. Grito antes do silêncio.
Preciso de ouvir, menos de escutar, mais de fazer do som o trilho e rastejar se for preciso. Aguento, aguento como nunca, recuso o tic-tac, grito-lhe por cima...ah, esse...Repetidamente feito hábito do desconjunto.
Torno às regras, releio ponto por ponto. Dou-me a certeza de cada palavra, atribui a cada som um eco e um sentido, uma pista nova. Nunca se começa do mesmo ponto. Perde-se antes a noção completa do tempo e do espaço...Agradeço o caos, habituo-me ao vento até não ser difícil ter os olhos abertos, escolho uma posição ao acaso, não digo o que a cabeça manda porque sou, momentaneamente, supersticiosa.
A pressa não tarda, adianta-me os pés às ideias.
Disseste que sim, miuda! Só pensaste depois.
O que é a vontade?
Prefiro a dúvida... por enquanto e enquanto me parecer mais fácil obedecer ao pensamento. Duvido da vontade posterior ao impacto e ao contacto...a pele costuma ter mais razão e eu sempre tive medo do toque
A dificuldade teima em ser protagonista da distribuição dos pontos de avanço

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Sísifo



Igual.
Menos força,
Mais forte sem ela porque ela supera-se a si mesma e anula-me...
Esqueço-me e a pedra rola.
Acima do corpo, porque a deixei mais além e me vim embora, montanha abaixo a colher mal-me-queres selvagens, dos mais bonitos...
O braço lembrou-se antes de mim...incrível como o corpo tende a anteceder-se...em tanto...
Foi o braço quem parou a pedra antes de ela me passar por cima, amparou-a e fê-la ressaltar com o impacto da energia cinética que lhe vinha integrada...
Os restos do corpo juntam-se, só a força os desacompanha...
Graviticamente atraente, a pedra...
Exijo chamar-me ao corpo, mitifico só a vontade que nunca me respeitou.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Tela

Dou-me ao vento.
Desprendo-me inteiramente, largo-me do controlo que aperta mais que segura. Avisto-me só, mais longe, só um pouco...Um pouco mais só, menos solitariamente acompanhada. Não te agradeço.
Danço, balanço...não conto as voltas, esqueço até os números...só por instantes, ainda são muito vivos, os inteiros, os com vírgula, os negativos, os fraccionados.
Passo à frente, passeio-me no corpo inteiro, desafio a alma a transbordar-me, habito-a, sinto-lhe os poros. Agradeço-lhe ter ficado.
O vento amaina-me a dor e canta, encanta o tempo e eleva-me o corpo...Leve, leve agora, leva-me longe, sonha-se a cores claras com nuvens de algodão.
Acordo.
Desço escadas, só demasiadas, sem número.
Entro.
Pego.
Compro.
Volto com o corpo e com a tela,
Pinto a cores,
Agradeço a vida.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Tortura

Pára, por favor. Já está a doer.
A dor. A dor.
Ela e ela,
só ela sem mim,
mais ela que eu,
ela e eu uma na outra,
entranhada, espezinhada.
Precisei de a sentir para saber que sentia.
Agora sinto e não suporto senti-la.
Tanto.
Demais.
A Mais.
Qual o princípio?
Esta sede revira-me na procura perversa do ponto sem "a mais".
Vai estar sempre a mais. Sempre, enquanto ela estiver aqui. Sempre enquanto este grito for tanto e lhe deres de ti mais do que a ti ou a qualquer coisa ou a alguém. Sempre a mais. Quando eras menos, mais "a mais" ainda... Regozijo de riso sarcástico eternizado nessa voz...
Essa não és tu.
Não é de ti nem para ti.
Eu não sou para ti...

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Lagarta

Passo, passo, passo. Chão. Ar. Vazio outra vez.
Caí do outro lado, ausentei-me do chão e nesse "ausentei-me" disse...tudo.
Resgato-me. Acordo. A tentativa foi só no sonho, do lado de cá sou menos forte...os músculos não obedecem ou talvez a vontade não lhes seja suficiente.
Minto? Digo a verdade? Confesso? Iludo-a? iludo-me? Melhor para fazer com que seja verdade, melhor para... Tudo desculpas... A ti. Desculpa.
Medo. Medo, medo, medo. Raiva outra vez... Era tão fácil! Vá lá, renega a pieguiguice, resigna-te à única saída: conseguir.
Não há, não há outra hipótese nem outra meta nem outro sol nem outro respirar acalmado pelo clima temperado com o carinho de Deus.
Mais um vez.
Mais uma, de outra maneira.
Pensa, pensa qualquer coisa diferente, qualquer coisa que te faça diferente, que te faça começar de uma maneira diferente. Já sei. Respiro pelo nariz: faço o ar tocar o fundo das narinas e entrar directamente para a barriga. Dizem que é a respiração correcta. Observo atentamente a primeira, depois reparo na atenção para a respiração demasiado perfeita. Errado, errado, errado. Não precisas de saber. Vá!
Concentro-me na árvore ao fundo, descentro-me.
Não dei por nada. Sinto. Está a contar.

domingo, 8 de junho de 2008

Número

DEMASIADAMENTE GRITADO!
Sinto que não cabe. Mas que está, aqui. Faz faísca em cada toque, balança-se o número da forma mais recta que imaginar se possa. Recta, linha, aresta cristalina que não esconde nada, não ocupa. Cresce o número, orgulha-se e incha-se para se me mostrar melhor, grita-se a si próprio na direcção interna.
Não quero, JURO.
Está-me agora mesmo a dizer que tem de ser, que tenho de voltar àquele lugar porque agora vai ser diferente.
Não quero, juro. Não mando.
Os caminhos encerram-se todos ao mesmo tempo, vedados de mil troncos sobrepostos em pilhas. Só um espera... Cheira bem, é bonito. Bonito de mais para ser verdade. Parece novo mas há um sabor amargo crescente na aproximação que lhe faço. Sentido único e aquele número.
Terreno plano, ilusoriamente plano e que é, afinal, um escorrega molhado... Sento-me à beirinha...
Perdi-me. Perdi as pistas. Caminho nenhum, demasiados passos ausentes de direcção.
Vou?
Fico, desta vez espero o tempo. Vou conversar com ele, perguntar-lhe o que acha... Sempre que o espero, qualquer coisa acalma.
Chamo a noite.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Pele

Já está. Ou quase.
Tenho um monte atrás de mim, de tralha sem prazo de validade...despejaram-me as gavetas, as mais pequenas e as maiores, e deixaram-me sozinha... Fui eu. Não. Melhor, era mais fácil que não fosse...balbuciava um "não fui eu" e olhava de soslaio a barafunda imensa que ameaça prender-me os pés, desprendida, de saída.
Está certo, não é justo. Deram-me as instruções todas e muitas vezes fiz-me desentendida dessa linguagem mecânica, precisava de pele.
Tenho um monte atrás de mim. Às vezes tento pôr-lhe as mãos...de repente os braços crescem, entrelaçam-se e deslaçam-me a vontade de rearrumar tudo de novo...Ah! o erro. É incrível e apetecivelmente preversa a tentação de pôr tudo outra vez dentro da gaveta, fechá-la e dar um ar limpo...afinal, o "monte" já não é. Foi, só. Mas é minha querida, é. Não desparece, antes se desfaz e metamorfoseia-se com ácido em vez de sangue.
Revolto-me com a teimosia e agradeço-lhe o fardo da antecipação um pouco sofrida, pré ocupada: "as gavetas têm de ser «arrumadas» algum dia...
Fico nua, com frio, feliz pelo frio na pele, pela pele e pelo que a roça desconfortavelmente, sem pressa, pela primeira vez. Tenho medo e não toco nem esfrego...Frágil, nova, ou talvez recém-nascida. Prefiro porque sinto.
Não ouso sequer chegar-lhe ao avesso...saboreio o direito, por direito meu.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Novelo

Reencanto o recanto mais uma vez.
Encantadoramente hipnotizo os passos. Não penses, não penses, por favor.
Sigo só, desacompanho-me dela...Tão presente ainda.
Reergome ao sol, recomeço, agora não do começo...doutro sítio qualquer. De outro lugar, de outro som... O ruído surge com cheiro a ferrugem. A acidez.
O suco renova-se, as veias acalmam as superfícies arredondadas que se riem perante a ameaça de rebentar. O medo é grande, nunca maior que o outro, o latejar constante que ordena e impede. Talvez esse outro não tão grande como o outro ainda...Qual? Perdi-me antes de o ver, desenrolei o novelo felpudo e emaranhei-me inteira sem deixar a ponta à vista. Há nós que não se desfazem sem cortar... Resolvo o novelo obsessivamente depois da certeza, aquela certeza tão à vista, esmagadora, crua e por fim...real: é preciso cortar.
Digo que sim, repito-o. Não quero pensar mas precipito-me...Penso sem querer...remedeio pensando com as mãos. Lucidez. Sei, quero...Sei tão bem o que quero. Desacredito-me e cumpro, obrigo-me. Sou a minha madrasta má. A agressividade toma-me por conta e tempo, somo-lhe a dor... A desilusão em forma de gente. Alegro-me ao fim do dia, desesperadamente contrariada dou "parabéns", afago sem braço nem mão com o tal carinho... Inundo-me.
Já Passou, adormece...por favor.

terça-feira, 3 de junho de 2008

Processo

Quando é que chega?
Desconfio do tempo...todo a mais como o palpável, o resto maior.
O medo envelhece mais rapidamente e a velhice morre de medo que a vida piore ainda.
A superfície arredonda-se e endurece-se de uma dor aguda e ácida.
O saber corrosivo chega mais longe e ressuscita mais do que eu pedi.
Juro, não fui eu quem desejei.
Culpo-me do desejo.
Volto a culpar-me dele com os apêndices todos...O processo é maior neles que no corpo.
Kafkianamente demoro cada interlúdio e floreio-lhe o já de si demorado tempo. A mais, a mais como o corpo, demasiadamente enrolado e tendido, ininterruptamente como o resto colado a ele.
Demoro-me a chamá-lo, recuso-me na chama e queimo-me a cada precipitação para o caminho que sei ser mais certo. Interrompo cada passo concreto, justifico cada incerteza com a minha falibilidade, demoro outra vez, outra e outra. Culpo-me agora mais da demora e demoro-me mais a culpá-la que a restringir o tempo sempre a mais que se lhe vai juntando. Envergonho-me da culpa toda junta, tão grande para alguém tão menor.