quinta-feira, 15 de maio de 2008

Campainha

A campainha toca.
Alguém a quer à porta.
Alguém lhe pede a presença, o mesmo alguém que pensa que tê-la presente é tê-la inteira.
Ela está abraçada pelos lençóis brancos que a tia lhe deixara de herança, demasiado embrenhada neles, extasiada pelo afecto que lhe roçam na pele.
A campainha volta a tocar, agora mais demoradamente.
Confunde-se se será sonho, o toque dentro do sonho ou o pesadelo da realidade.
Pensa só na campainha, nunca que é alguém que a toca.
Depois desconfia... Tem medo da hipótese, congela o corpo para o vento não ser maior.
A campainha toca mais uma vez, depois o toque... o som do punho cerrado a tocar e a afastar da madeira.
Conta.
Quatro vezes.
O "alguém" ganha corpo e põe-se a pensar em todas as hipóteses, pessoas que poderiam insistir na sua presença à porta de sua casa.
Odeia a pessoa, já com corpo mas ainda sem rosto.
O silêncio diz-lhe que está de novo sozinha.
Sente frio, a raiva da interrupção vira-se do avesso...Oferece cara ao corpo e corre de pés frios no chão gelado até ao hall. Olha-se ao espelho, acredita.
Abre a porta.
O elevador chegou ao rés do chão.

Sem comentários: