quinta-feira, 30 de setembro de 2010

esta espécie de obrigação

última refeição da noite
último mini-copinho cheio de comprimidos de diferentes tamanhos a prometerem uma noite descansada.
último "boa noite" carinhoso de quem mal conhecemos
primeiro confronto com a certeza: é a última noite.
Foram bem mais os dias que aqui passei do que os previstos... e foram bem mais as vitórias... Talvez por isso, sim, talvez seja por isso que o soluçar se irrompe de uma forma tão brusca do peito e me deixa pesada no chão sob um manto de responsabilidade.
Tudo isto foi importante para me mostrar que é possível
Mas eu não vou prometer nada porque eu não me conheço no futuro.
Cheguei mais perto só para tocar a vida do lado de lá... e acho que vou gostar. Cheguei à ponte... falta andar.
A decisão é agora, de agora...
Feliz ou infelizmente, nada de nada é para sempre... isso é demasiado tempo.
Hoje não tenho pressa, e espero que esperem...que aprendam e saibam esperar.
Eu não prometi nada a ninguém.

ultimo dia inteiro aqui

As voltas que se dão.. acho que se chama Vida
Primeiro o medo, um querer e não querer por não querer inteiro, o medo do desconhecido, a vontade de ainda ir a tempo de mudar alguma coisa, por mais pequena que fosse. Foram meses de dúvidas na cabeça, outros tantos de dúvidas no papel, depois em conversas hipotéticas, depois inevitáveis...O meu sim e o tem de ser.
Parar.
Parou-se.
Parou o ciclo, mudou-se o sentido...tirou-se a força de um sítio que veio pesar noutro, bem mais abstracto, mais difícil, mas muito mais verdadeiro... a verdade.
O corpo ficou ferido mas aparam-se só as crostas e deixa-se ao ar... de olhar atento, sempre atento... Não bastam duas mãos nem quatro... Deus criou-nos demasiado complexos e nada aqui vive num estado isolado... nem ninguém... As mãos tocam-me o corpo, tocam-me a alma e tocam-me o coração. A verdade é que ainda não se encontrou o vírus, a tal da dor... mas é preciso ver o lado positivo... aqui aprendi onde é que ela não mora... Não é um número nem um nutriente nem uma conta matemática que te reviram a pele e te apertam e cercam o coração e a alma toda de espinhos... não são eles que te fazem sangrar e acreditar que se pode morrer de tristeza... E nada disto é novo, só é um bocadinho mais certo... e seguro a mão sem estender a minha.. é que desbastar terreno e limpá-lo evita fogos... mas põe a nu a matéria de que é feita a terra.
Não é possível fazer uma coisa de cada vez, como não é possível respirar sem que o coração bata ou vice-versa, e é preciso aprender a lidar com este delay entre a pressa do corpo e o demorar cá de dentro... E é preciso coragem para não parar
E é precisa força para arriscar e continuar assim, de frente, em frente... é preciso tentar tudo antes de desistir.
Insistir
Persistir
Ficar aqui

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

sair

Devia deixar de ter a mania que acerto em tudo.
Estou ainda receber, a dar-me mais segundo as regras daqui... Já não há aquele pensamento primordial e doentio de como tentar fugir um bocadinho às obrigações que implicam a aceitação de estar aqui. Nem há força nem vontade para isso... e ainda bem.
Agora que já há dia certo para regressar a casa tento imaginar o meu dia-a-dia sem o frenesim antigo que fazia o tempo andar mais depressa... Sim, um dos meus medos é que o tempo não ande e fique parado a gozar comigo...
Penso em mil e uma estratégias, nenhuma me parece verdadeiramente aliciante, aliás... quando me pergunto o que é que quero fazer, o NADA é a única palavra que me aparece na cabeça em letras maiusculas... Mas eu sei que nunca me dou ao 'nada' demasiado tempo, que temos alergia um ao outro e surge sempre alguma ideia para... sei lá, nem que seja para fazer andar mais depressa o tempo.
E não vou fugir, não vou deixar que esta ânsia de querer que tudo se torne "normal" se ponha à frente dos passinhos todos que me puseram os pés em sangue para aqui chegar.
Repita-me tudo o que me disse ontem... que náo estou a ser desinteressada nem má profissional. Diga-me que tenho direito à recuperação e que este é o único modo de o fazer...
Ajude-me a cada dia a despir um bocadinho da culpa, essa ue tem a mania de se sobrepor... capa, sobre capa, sobre ti...

terça-feira, 28 de setembro de 2010

ainda não me disseram, mas vou hoje embora

De repente acontece o que é suposto acontecer...ali, ao milímetro... as pernas perdem a força, a cabeça ergue-te.
"Está tudo bem?"
Está óptimo pelo que se vê...
A conversa de hoje não será muito mais que as restantes já tidas e, não me venham com histórias, porque o meu guarda mais que os outros. ponto final.
Já me sinto desamparada e nem sei qual é a temática de hoje, ou melhor, qual o caminho, porque em termos de teor é sempre, mais coisa menos coisa, igual.
Era agora que eu precisava daquela ajuda milimétrica de passo a passo...de birra em birra porque até aqui.. foi "simples"... e agora que os resultados, os 1ºs que apareceram, e nem sequer foram retestados, estão nas mãos de toda a gente e a cobrir a minha cabeça inteira, abrem.te a porta de sorriso nº 4... Precisava de tempo aqui, a combater esta vontade que quer dar cabo de tudo o que consegui?? sim! vou pedir? não..já não peço mais nada...deixem-me ir à minha vida que eu, como sempre, resolvo...
Sim, estou cheinha de raiva e dores em tudo.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

daqui a pouco

Já daqui a bocado começa o amanhã que mete medo, pelo menos respeito...
Vou dar por um chegar pesado e desengonçado da enfermeira a trazê-"la" e a mandar-me subir.
E eu a tremer, ainda ensonada só vou querer ver....
Ver o quê?
Não é nada disto nem por nada disto, ainda que isto influencie o resto do teu dia...entre conversas com todas as medicas que fazem parte do teu "estar aqui".
Não sei se é uma despedida, mas o ar cheira-me a já nada estar a fazer aqui... também tenho medo do "lá fora", mas esse vou sempre ter..hoje, amanhã, para o mês que vem...só houve uma coisa que gostava de experimentar cá, acompanhada, e não vai acontecer... porque o "filme", a vida..ou qualquer dessas coisas está já feita na minha cabeça: O numero aumenta significativamente, a seguir vêm os parabéns, a seguir a conversa do "objectivos cumpridos", logo depois uma conversa mais profunda como se a alta nada tivesse que ver com a engorda ao ritmo exigido... pedem-te o de trás, por trás disto...e estás tão enervada que não queres saber de mais nada... e vais para casa...matas as saudades, e morres de medo.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Quase nascer

Tenho tudo aqui,
a sair da boca, a escorregar pelas mãos a verter dos olhos, a desfazer-se em passos que vão dar sei lá onde...
Nunca pensei dizer "nunca pensei"... e já tinha lido muitos "nunca pensei"... Eu sonhava, sim, às escondidas, que o daqui a bocadinho doesse só um bocadinho menos.
Assusta saber que esta é uma batalha que ainda agora começou...tenho curiosidade de ver até onde vai o meu querer, até onde serei capaz de pedir ajuda e até onde os "ajudantes" perceberão que vão haver alturas em que me terei de por à prova e eles não vão poder estar...
A minha queda foi como a de uma pena, leve, demorada...mas o precipicio nunca mais acabava, não havia fundo... Pensavam, pensaram sempre que não havia fundo ou se pensassem não fizeram nada para me impedir de lá tocar.
Procurei braços e abraços, tive tantos, tão bons, tão quentes e preciosos... tantos que eram hologramas, tantos que eram sonhados por mim... tantos porque faz parte...
A lentidão da queda acentuava a inquietude e procurei qualquer coisa, qualquer coisa ou alguém...
e encontrei e enganei-me e procurei outra vez e desisti e falhei e recomecei e aleijei-me e recuperei e lambi as feridas e mascarei-me e menti e omiti e procurei, e gritei e disse que já não aguentava mais...
E pararam-me quando perceberam que eu não ia parar
E vocês olhavam-me e eu culpei-me de vocês nada terem feito para me pararem,
E hoje sorrio,
Porque hoje o teu "bom dia" faz tremer cá dentro, os teus abraços já fazem lágrimas que não sou obrigada a esconder (é verdade...pode-se chorar!)
E tenho medo de ir mas curiosidade também
quero tudo e nada ao mesmo tempo
e quero que não queiram que eu queira mais que aquilo que eu hoje posso querer... é que custa... há ainda vezes tantas em que não se quer.

Não sabia que o que sinto hoje existia para se sentir

sábado, 18 de setembro de 2010

TODO O VERBO SER

ESTOU ORGULHOSA DE MIM

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

estar aqui

Claro que nem tudo podia correr às mil maravilhas...
aqui sofre-se até o corpo fazer contorcer a alma e não há ninguém para agarrar... simplesmente porque sabemos que a vontade que nos está a deixar loucas não é a nossa real vontade.
Há dias mais difíceis que outros, mas a sensação
com que fico é que passou tudo a correr e que ainda precisava de aprender tanto...
Ontem menti aqui pela primeira vez, foi a pior sensação de sempre...mas se eu sou sempre tão boa a mentir, será que eu queria ser descoberta? isto é estúpido, mas ando com a cabeça às voltas...
Ao fim do dia estive com a minha querida médica e lá contei a verdade...e pedi mais ajuda...ajuda que nunca mais me deixasse fazer mais destas mentiras. Bem sei que cá fora vou ter de ser eu, sozinha, mas se pelo menos eu perceber que é possível, que ainda que com ajuda eu consigo..então vale a pena...
A única coisa que eu peço é que o dia em que sair seja diferente que o anterior a ter entrado...
Hoje tenho um bocadinho de esperança,
Será que alguém ainda acredita em mim?

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

escrevam-me

Só para dizer que os resultados estão a ser bons,
que estou eu mais surpreendida que a equipa,
que têm todos um carinho por mim inimaginável...
Só tenho medo que o tempo seja pouco, já estou com medo do regresso.
Queria ter a minha mala das ferramentas bem cheia e pesada mas não me querem tirar do mundo, pois essa é a minha maior facilidade...
Aqui tudo é muito calmo, estou ligada 24h porque o corpo precisava mesmo e eu não lhe andava a ligar nenhuma...
Tenho regras, tenho muito apoio, imenso carinho (e dizem-me que esse é um dos ingredientes principais!), finalmente estou a aprender a confiar, a entregar-me a pedir ajuda quando sinto perigo... e não está cá mais ninguém "como eu"...tudo aqui é diferente... Usam tanto esta palavra comigo, porquê?

um grande beijinho e escrevam-me...sabe bem

domingo, 5 de setembro de 2010

chegar sozinha

Sim, já devia estar lá.
Como sempre pedi para "deixar tudo pronto", ainda na ilusória crença que uma coisa dessas é possível...
Bem, a verdade é que não tenho nada pronto nem sequer capacidade de o fazer. Agora sobre os ombros e a (minha) censura, a obrigação de deixar tudo impecavelmente arranjado para a minha ausência que só temo que seja demasiado curta... já não me assusta.
Não me perco a imaginar por falta de tempo e falta de chão nesse hipotético sonho... sei o que não me faltar enquanto lá estiver, mas pouco ou nada sei do me vai esperar...
E não fui capaz de contar, de conversar com ninguém assim, com as palavras, com o que fosse preciso, não há ninguém aqui... mas estes dias vão ser Dias.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Amor

Será que posso dizer que tenho medo?
que desde aquele dia acordo mil vezes de noite e choro até nascer o sol?
Será que posso dizer que esta energia toda vem da vontade de esconder esta ansiedade em forma de "eu-não-vou-chorar" para poder acabar o trabalho todo antes de ir?
Será que me desculpam se eu disser que mesmo antes de ir não estou a cumprir tudo o que devia já ser capaz de fazer?
Será que não sou ingrata e será que mereço esta bondade toda e este AMOR que me tem sido atirado para cima em forma de abraços noite e dia?
seria preciso chegar aqui para ver como tanta gente gosta de mim e não se esquece?

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

VOU!

Vou.
Respiro ainda a tremer, entre soluços.
Já não há nada a decidir nem a pensar. Não é preciso adiares mais na tua cabeça, não são precisas mais desculpas nem mais medos nem mais porquês.
Pela primeira vez foste de certo modo surpreendida, e disseram-te coisas que pensavas só pertencerem a outras bocas mais próximas (mas essas calaram-se sempre).
Pedi só alguns dias para deixar tudo preparado e a minha cabeça o mais limpa possível da culpa... embora haja 'culpa' que me vão obrigar a levar aqui dentro, comigo...
Deram-me os dias a medo, não sabem o que vai por trás da pele translúcida, dessa imagem minha que dizem ser tão diferente de há meses para cá...
Eu continuo a olhar, não sei se a ver... de onde é que saíram esses 8 bocados com medida?
é que a dor pesa tanto...
mas há agora um lado (saudável) mais calmo... é que eu nunca volto atrás quando digo que Vou. Vou